domingo, 15 de maio de 2011

Um café, um cigarro e 15 minutos.

Meus dedos digitavam rápido o maldito trabalho que eu já não podia mais protelar. O escritório parecia pequeno demais pra minha raiva. Queria gritar, queria espernear, queria jogar um copo na parede.
Mandei os estagiários irem almoçar.
- Mas já, doutora? Ainda são 11h da manhã.
- Meu filho, vai. Corre daqui enquanto você ainda tem tempo. Tô mandando ir logo. Voltem às 14h. Nada antes nem nada depois disso!

Meu sócio tá com a filha doente no hospital. Essas coisas que criança nova vive pegando. Gripe ou coisa parecida.
Casal de primeira viagem acha que qualquer resfriado já é uma tuberculose. Então deixa eles com as neuras deles que as minhas já são muitas.
De repente eu parei e fiquei sentindo a ausência de vozes na minha sala. Eu poderia dizer silêncio mas compramos um escritório no 3º andar em uma avenida super movimentada. Levantei, joguei os saltos pra debaixo da mesa e andei descalça como se me livrando daqueles sapatos desconfortáveis minha alma também se sentiria confortável.
Sentei no sofá mas ainda precisava de mais um conforto. Levantei e arranquei a meia-calça como se arrancasse minha própria pele saindo de um eu que não sou eu pra um que tenta ser eu.
Meu divórcio saiu há um mês. E tem seis que eu não fumo nem bebo cafeína que é pra não piorar a insônia. Tô fazendo yoga, tai chi chuan, meditação e um milhão de coisas que meus amigos dizem pra eu fazer pra não ficar martelando minha própria cabeça do porquê joguei meu casamento no lixo.
O fato é que meu casamento, como vários, não resistiu à crise dos sete anos e agora, cá estou divorciada e sem nem saber como paquerar alguém após 9 anos de absoluta monogamia. Os que mulheres com 33 anos fazem pra arranjar um namorado? Internet? Boates? Mulher já pode chegar no homem e ter a atitude de convidar pra sair? Pode pagar bebida na balada?
Só o alívio da meia-calça não adiantava. Eu preciso de algo mais.

Fui até a copa e abri o armário. Raul gosta de café extra-forte. Mas como amigo e sócio, pensando no meu bem estar, resolveu esconder a droga da viciada aqui. Achei o potinho. Cheiro de café de verdade. Não aquela água açucarada que eu venho bebendo. Peguei minha caneca, taquei água fervendo e três colheres bem cheias do café solúvel. Dei uma golada como uma criança beberia do rio de chocolate do Willy Wonka. Café é libertador. Café é vida!

Subi pro terraço. Descalça e sem meia calça e já com a gola da blusa desfeita. Pouco apresentável, mas no terraço do prédio ninguém iria me incomodar ou roubar meu café.
Fiquei lá observando a avenida. Aquele bando de gente apressada, carros indo e vindo. Criança chorando, cachorro latindo. Mas ao mesmo tempo que estava à minha frente, estava tão longe. Tão longe que consegui anular aquilo e olhar só o horizonte.
De repente a porta se abre e um homem aparece. Um semi-engomadinho, gravata afrouxada e uma cara conhecida.

-Oi
-Olá
-Tudo bem?
-Sim
-Fazendo o que aqui?
-Nada
-Você é assim sempre tão monossilábica?
-Oi?
-Ok, deixa pra lá. Miguel, 4º andar
-Ehhrr Andrea, 3º andar
-Aaah a advogada, né?
-Sim.
-Sempre vejo você no elevador.
-Eu acho que eu nunca te vi.
-Pois uma mulher bonita como você nunca passaria despercebida.
- ...
-Posso fumar?
-Você veio aqui pra isso?
-Você se incomoda?
-Porque eu deveria?
-Você vai ficar fazendo perguntas? Posso ou não?
-Eu sou a sua consciência?
-Hahaha. Tudo bem então.

Eu podia pedir o telefone dele naquela hora. Ou podia me jogar pra cima dele de uma vez. Eu já tinha visto ele no elevador, na portaria, na garagem. Certa vez ele achando que eu não tava ouvindo comentou com um amigo que me achava gostosa. Não sou puritana, foi bom ter ouvido aquilo, mas deixei pra lá porque ainda era casada.

-Me dá um cigarro?
-Você fuma?
-Não, meu celular descarregou e preciso mandar sinal de fumaça pra minha empregada não esquecer de alimentar meu gatos...
-Hahaha. Engraçadinha. Mas é sério, você fuma?
-Se você vai me fazer perguntas, sugiro que nos encontremos num tribunal pra fazer isso perante um juiz...
-Calma, gata. Tá aqui seu cigarro
-Obrigada. Tem seis meses que eu não fumo. Tô em crise de abstinência de nicotina.
-Seis meses? E porque fumar justo agora?
-Apenas não estou tendo um dia bom.
-Por que?
-Um caso chato, pessoas me irritando, meus pais querendo se mudar pra minha casa, e a filha da empregada comendo meus doces escondidos.
-Então que tal no fim do expediente a gente sair pra tomar alguma coisa e eu te fazer relaxar, te dar algum prazer?

Daí ele se aproximou. Pronto. Aí é o ponto. Homens bastam ver uma mulher com alguma fragilidade pra convidar pra sair. Senti a segunda, a terceira, a quinta e até a ré de intenções naquela pergunta. E definitivamente, nem com todo tai chi chuan e todo antidepressivo que houver nessa vida, eu ainda não estou pronta pra outro envolvimento afetivo.

-Queridinho, obrigada pelo convite, mas todo prazer que você podia me dar durou os 15 minutos desse cigarro. Tenha um bom dia!

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