sábado, 25 de outubro de 2008

Volta TV Colosso!

Minha mãe embrulhava presentes pra festa do colégio dela. Meu pai lia as últimas notícias na internet.
Eu, tentava enrolar na cama. Geralmente é assim, eu acordo e posso passar horas tentando lutar contra a força que me prende ao colchão.
Gosto de ficar pensando, pensando, pensando.. Pensando naquilo que deu certo, no que não deu, numa frustração que me arrebatou no dia anterior, no que eu vou fazer mais tarde, se enrolo as pontas do cabelo pra fora ou pra dentro na hora da chapinha, como eu vou estar daqui a 15 anos.
Essas coisas, banais, importantes, indispensáveis.
De repente, ouço do quarto, minha mãe comentar com meu pai sobre o caso da menina que foi assassinada pelo ex namorado que a sequestrou e matou. Sim, caros amigos, ela mesmo. A Eloá.
Eu simplesmente, acho incrível - só pra eufemizar, porque eu iria dizer mesmo era, que é inaceitável e inacreditável - que de repente essa menina tava mais dentro das nossas casas do que nós mesmos.
Aqui então, a cada flash da globo e da record, mamãe soltava o suspiro de "Ai meu Deus. Eles apareceram na janela. Ele tá atirando. Cuidado!". Um dia, durante as 100 horas de sequestro, olhei até pra janela pra ver quem era que tava lá. Ninguém.
Aliás, janela por janela, pobre Isabela que também não teve uma relação muito saudável com uma janela. Nem com a Globo. Ainda bem que minha casa só tem um pavimento, se eu cair da janela, só ralo o joelho! Mas eu tava falando da Eloá, a filha mais velha dos brasileiros, a Isabela era a caçula. Depois falo dela que também sofreu a mesma coisa.
Enfim, a Eloá de repente conquistou o que toda menina na idade dela, sonhou um dia. Popularidade. Duvido se não tem um monte de crianças batizadas com o mesmo nome em homenagem a ela. Só é uma grande lástima que essa popularidade tenha vindo sob um enfoque tão triste e trágico.
Mas tristezas à parte, vou falar sobre algo que definitivamente me incomoda muito.
Eu nunca vi essa menina pessoalmente, nunca fomos apresentadas, não sabia nem quem era Nayara, Lindemberg, os outros reféns, os pais deles, o capitão da polícia e nem os vizinhos que dão entrevistas e depoimentos. Mas aí, foi só a Globo jogar no Jornal Nacional que a vida Eloá cruzou com a minha.
Não, eu não tava lá, eu não fui lá, eu só fui saber do sequestro, na verdade, no último dia ouvindo uma brincadeira do meu melhor amigo que disse "Te cuida com o teu ex, de repente ele tenta te sequestrar!" e por uma mulher que fez o meu pão com queijo na padaria.
Foi aí que na hora do jantar, eu me dei conta que meus pais se rendiam a uma espécie de reality show dos horrores. Eles e o resto do Brasil.
As pessoas acompanharam cada minuto do sequestro. Minha tia podia escrever o inquérito todo, contando cada detalhe. Se quiser, ela dá até a opinião!
Minha prima vai pro msn e coloca na mensagem de exibição, "Luto! Eloá Cristina Pimentel. Nós sempre te amaremos. Saudades eternas". Cheguei a perguntar quantas vezes ela foi a Santo André nos 11 anos de vida dela.
O meu pai acredita que o cara é um inescrupuloso e que deve responder de acordo com os crimes que cometeu, sem ter direito a atenuante algum. Papai não é advogado, ainda bem.
Mamãe também não é advogada, ainda bem. Aliás, é a única pedagoga que eu conheço que não acredita em reabilitação social. "Nada de reinserção na sociedade. Pena de morte pra ele" brandava ela enquanto eu tranquilamente passava requeijão no meu pãozinho, no dia subsqüente ao fim do sequestro, em que todos se acham psiquiatras, advogados, juízes, peritos, sociólogos, filósofos...
A titia perguntou o que eu acho. Fui categórica, "Acho que esse caso já encheu o saco! A menina já morreu, deixa ela descansar em paz. Prende o cara, faz ele pagar pelo crime dele e volta Os Normais, Tv Colosso, Tv Pirata e Sai de baixo."
Acho que a Globo perde muito tempo fazendo todo mundo de fantoche. E deveriam respeitar os sentimentos e os pesares das famílias que eles colocam na berlinda cada vez que um crime acontece. Eu que já quase nem assistia tv, nas últimas 2 semanas aumentei minha coleção de filmes baixados na internet. Lendo dois livros simultaneamente. Os vizinhos me acham estranha, porque eu sento no jardim pra ler e porque não assisto novela. Quando me perguntam algo sobre novela, eu fico voando.
Acho que a essa hora tá passando pela sua cabeça "Nossa, que menina insensível." Acredite, eu imagino a dor da família de todos os envolvidos, lamento a perda de mais uma vida inocente e peço a Deus a iluminação devida as vítimas e seus familiares.
Mas esse fato de que de repente todo mundo se sente parente da Eloá, enche o saco. Eu não sei as proporções da dor que a mãe dela tá sentindo, como os pais do Lindemberg estão ao saber que o filho é um assassino, como tá se recuperando os ferimentos da Nayara. Nada disso.
Eu só sei o que a tv mostra, o que as pessoas comentam no ônibus, o que a mulher da padaria do supermercado falou de manhã cedo enquanto eu tomava meu café, e foi aí que fui saber o que tava acontecendo, que se tratava de um ex namorado desesperado com fim de um namoro.
Um especialista disse que ele tinha dificuldades em lidar com frustrações. Ora, eu não sou formada em PN e sei disso, ok? Por isso que sempre digo: Acreditem no poder do Carbolitium e da fluoxetina!

Agora é esperar pelo próximo acontecimento trágico que a Globo vai ficar bombando.
Se tiver outro sequestro nessas proporções, não deixe de aproveitar. Compre o pay-per-view pra acompanhar minuto a minuto.

É, isso é Brasil.
Eu odeio a Globo!