sábado, 23 de maio de 2009

Craniotomia jornalística

Mais uma vez, eu deveria estar estudando e escrevendo alguma coisa de útil pro meu Projeto Interdisciplinar de Psicologia e DAF no qual deveria escrever sobre Violência e Terrorismo em relação à Ética do Advogado.

Fiquei horas olhando pra minha tela. Escrevi, apaguei, escrevi, apaguei, escrevi.
Não, não tava bom. Apaguei de novo.
Eu simplesmente adoro escrever, mas esses tempos eu não tô rendendo muita coisa.

Enfim, depois de assistir uma aula de Psicologia Forense e debater a questão da Violência, das causas de agressão e avaliar os dados estatísticos da violência no Brasil e no mundo, pensei eu que poderia escrever algo. Só que a cabeça realmente não tá ajudando muito.

Mas vou dizer o que eu acho da violência hoje em dia.
Divergindo fervorosamente da minha professora de Psicologia, acredito sim, que todos nascemos com um potencial agressivo. Mas as nossas experiências de vida é que vão definir a que ponto esse potencial irá evoluir.
A prova disso é que tem aqueles dias que o sentido de "Que vontade de matar fulano" sai um pouco do enredo literal e assume uma conotação um pouco mais preocupante.
Aula de Psicologia grátis: Segundo Freud, nosso aparelho psíquico é estruturado em 3 partes. O ID, o Ego e o Superego.

O ID é regido pelo princípio da satisfação imediata do prazer.
O Superego é responsável pela censura extrema dos nossos desejos, pois é regido pelo princípio da realidade.
Já o Ego assume a postura de mediador entre os dois supracitados e busca resolver o impasse existente quando há o confronto entre o desejo e a repreensão de não atendê-lo.

A agressão é a ação humana cercada de intencionalidade de ferir, magoar ou lesar outrem.


Enfim, a explicação psico-orgânica da violência está no fato de que então o indivíduo agressor tem problema na harmonia entre as 3 estruturas do seu aparelho psíquico.
Mas então como explicar a propagação da violência? Mídia!
A mídia e o seu sensacionalismo barato.

Falando exclusivamente da imprensa na minha cidade, posso dizer que perdem muito tempo pensando em ganhar cada vez mais dinheiro e se esquecem de divulgar coisas mais interessantes que de fato ajudariam a manter a sociedade devidamente informada.
Não é segredo pra ninguém que os cadernos policias de jornais paraenses mostram a verdade nua e crua dos crimes ocorridos nesta região.
E não é incomum ver fotografias mostrando vísceras sobre calçadas, ou corpos envoltos em poças de sangue, sempre com a multidão por perto feito urubu sobrevoando a carniça.
Eu sei que muitos casos ali retratados são de meliantes que morreram por acertos de contas com a polícia, a sociedade ou por outros meliantes. E lógico que eu defendo a dignidade deles, afinal, são pessoas detentoras de direitos e deveres como qualquer outra, mas em algum momento deturparam suas condutas e se tornaram uma ameaça a boa convivência social.
Então porque um jornal pode estampar a imagem de uma pessoa como se fosse uma coisa banal? Onde fica o respeito com os mortos? Ou só porque a capacidade civil se encerra com a morte, acha-se no direito de veicular a imagem sem respeitar a memória da família?
E aí então que a violência ganha forças e se enraíza na sociedade.

Dados antropológicos revelam que não exista nenhuma sociedade no mundo que esteja livre da violência. Mas como temos sensibilidades jurídicas diferentes, em muitas o conceito de crime varia. Em algumas sociedades africanas é prática corriqueira extirpar o clitóris das mulheres que atingem a maturação sexual para que as mesmas não tenham nenhum um tipo de prazer no ato sexual que pra eles é visto com o intuito único de procriação.
Já em algumas sociedades asiáticas, o filho varão é superestimado, o que resulta na morte de inocentes meninas, depois ou até mesmo antes do fim da gestação.
E aqui na nossa cultura? Aborto e infanticídio são crimes, assim como a multilação clitoriana.
Mas somos diferentes, somos multiculturais.

E deveríamos nos sentir os melhores? Não!
Em alguns pontos, somos mais humanos, já que vivemos num Estado Democrático de Direito e portanto, primamos pelo bem comum.
Mas por outro lado, essa democracia saiu do controle de nossas mãos, representadas pelas mãos dos nossos governantes.
Fala-se em voltar à época da Ditadura. Mas não nos esqueçamos que a Ditadura repreendia o direito à informação, expressão e desenvolvimento intelecto-cultural das pessoas. Direitos estes, previstos na Declaração Universal dos Direitos Humanos e na nossa Constituição Federal.

O fato é que a mídia acaba sendo uma faca de dois gumes. Ela passa sim muita informação útil. Tanto que quando uma nova lei que beneficia uma grande parte da sociedade é aprovada e entra em vigor, ela é amplamente divulgada, assim como campanhas de conscientização de cidadania.
Mas não podemos fazer vista grossa e ignorar que os jornais falam e mostram mais violência do que boas notícias.
Eu inclusive já até escrevi sobre o reality show dos horrores que a Globo sempre transmite. E ampliando mais o olhar, até os desenhos animados assistidos por nossas crianças impõe a violência desde cedo. Estamos acostumados com os super-heróis que matam e ficam impunes porque agem em defesa dos oprimidos. Desde quando é certo ensinar a uma criança que é aceitável que ela faça justiça com suas próprias mãos?
Agora que eu cresci e entrei pro mundo jurídico, não consigo ver nada além de homicídios qualificados nesses casos hipotéticos. Não cabe nem legítima defesa na maioria.
E por falar em crianças, eu não gosto de qualquer uma. Na verdade, só das que considero meus sobrinhos. Mas as que começam sua carreira artística precocemente na TV me dão nos nervos. Por serem fabricadas por adultos que as utilizam somente com intuito de ganhar dinheiro e assim, interrompendo a infância normal desta criatura que certamente crescerá e provavelmente se tornará um adolescente problemático. Exemplos disso são Ashley e Mary Kate Olsen e Macaulay Culkin.
Mas no último domingo aconteceu a coisa mais ridícula que eu já vi na TV brasileira em relação a esses astros infantis.
Eu não suporto a Maísa. Mas quem acompanhou o programa vespertino que ela faz ao lado do Silvio Santos e tem o mínimo de compaixão pela existência alheia também deve ter achado repugnante o que aconteceu. Eu particularmente não assisto nem TV no domingo. Mas como estava com a minha avó que é telespectadora fiel da programação do SBT acabei vendo. Aquilo ali foi uma agressão gratuita.
Pra quem pegou o bonde andando, esta criança se feriu ao bater a cabeça no suporte de uma câmera. A produção do programa em vez de procurar retirar a menina do palco e lhe prestar o devido socorro para avaliar se ela não tinha ferimentos, simplesmente a manteve no ar, sob choros, gritos e lágrimas da menor e as gargalhadas fervorosas da platéia, do apresentador e da equipe do programa.
Se não me falha a memória, ela não deve sequer contar mais do que 7 anos de idade. O que de acordo com as nossas leis que originam o ECA (Estatuto da Criança e Adolescente) menor não pode nem trabalhar. E a situação se complica ainda mais porque ela foi exposta em cadeia nacional quando chorava pedindo por ajuda.
E se fala em uma mídia que respeita a sociedade? É esse tipo de respeito que nos ofertam?
Reitero que eu não gosto dela, mas mesmo assim, saio em favor do ser indefeso ali naquele circo dos horrores e pensei que se fosse minha filha, não havia contrato milionário ou fama no mundo que viesse a compensar o desrespeito a que ela foi submetida.
Devemos pensar mais a respeito da relação entre a mídia e a violência. Há que se tomar medidas mais enérgicas que proíbam que toda essa carnificina nos seja enfiada goela abaixo. Mal ligamos a televisão ou lemos o jornal de manhã cedo e já nos deparamos com a violência escancarada a nossa frente. Chega a ser indigesto ver isso durante o café da manhã.

É isso que eu penso sobre a violência. Não é só colocar mais policias na rua, construir mais cadeias, reformar o Código Penal e nem só melhorar a educação. É um conjunto de políticas públicas que vão além dessas mudanças. Há que se mudar também a educação jornalística de hoje. Nada contra jornalistas, até porque tenho uma grande amiga, jornalista, blogueira e mãe exemplar, Mari Camata (http://alamaryjanne.blogspot.com) que manda muito bem no seu trabalho sem precisar apelar para o sensacionalismo.

Agora, bem que isso podia prestar pro meu Projeto, mas deixa pra lá. Pelo menos desabafei como jovem, como feminista, como advogada e sobretudo como ser humano.